Madame Bovary - resumo
Existem livros que precisam ser lidos e relidos. Madame Bovary é uma dessas obras que você nunca vai esgotá-las por apenas uma lida. Resolvi reler esse livro. E foi tão avassalador como na primeira vez.
Madame Bovary foi escrito em 1857 e foi considerado um escândalo na época. Imaginem! Sem falar no adultério de Emma, um escândalo para a época, o livro critica muito a igreja e a burguesia. Flaubert foi a julgamento diversas vezes pelo romance e em uma de suas defesas, declarou “Emma Bovary c’est moi!” (Eu sou Emma Bovary!), falando assim da sua própria indignação com o clero, a sociedade e as coisas mundanas. Apesar das acusações, Flaubert nunca foi preso.
MO romance conta a história de Emma, uma moça criada no campo, mas com sonhos burgueses. Inspirada pelo que lê nos livros, Emma quer uma vida melhor, cheia de mimos e coisas que só os ricos podem comprar. Pensando que poderá alcançar o que tanto quer, Emma casa com Charles Bovary, um médico também do interior.
O romance começa apresentando Charles Bovary adolescente. Um garoto meigo, monótono e estudioso, que no seu percurso de vida acaba se tornando um médico. Não um grande médico, mas um médico no mínimo dedicado à profissão. Sua mãe lhe apresenta uma mulher chamada Madame Dubuc. Uma mulher de meia-idade e rica. O casal muda-se para uma pequena cidade chamada Tostes, onde Charles começa a praticar medicina.
A personagem Charles, se lido por Nelson Rodrigues provavelmente achará que nela um “corno manso”, um estúpido, ou um perdedor. Um insensível, pois não consegue captar os sentimentos de Emma.
Emma Bovary? Bem, na literatura há uma grande tradição de heroínas belas e virtuosas. Sabemos que Emma era linda, então presumimos que ela era boa. Mas não, ela não era. Ela se recusa a ser boa. E Flaubert nos desafia, ele zomba de seus protagonistas, ele não nos deixa admirar ninguém. Nos dias de hoje, com o politicamente correto dando as ordens nas redes sociais, Gustave Flaubert provavelmente seria considerado um misógino.
Charles ama Emma apaixonadamente, mas por ignorância, não dá valor as coisas que Emma dá, não vê a beleza como Emma vê e é, na visão própria, extremamente entediante. Tentando suprir essa falta que o sonho de uma vida melhor faz, Emma procura em outros homens o alicerce para os seus desejos.
Emma Bovary não era uma mulher valente e virtuosa que no final sai triunfante. Era uma mulher que foi educada em um convento e possuía uma vocação religiosa, mas foi perdendo o interesse pela Igreja quando começou a ler romances de uma biblioteca pública. Nesses romances, Emma Bovary aprendeu que ela poderia escapar do mundo real para a ficção. Como? Ela aprendeu sobre encontros à meia-noite, noivas roubadas, paixão e glamour. Ela aprendeu que o amor romântico era o equivalente a uma dose de adrenalina que valia a pena ser vivido. Esse era um sonho de adolescente, impossível de realizar, mas ninguém lhe disse isso. Afinal, sua mãe já estava morta. Esse sonho tornou-se uma espécie de um ideal. Muito parecido com o Cavaleiro da triste figura, Don Quixote, que desenvolveu o mesmo encantamento lendo romances de Cavalaria, até se transformar em algo que era impossível ser.
Gustave Flaubert escreveu Madame Bovary primorosamente e maravilhosamente bem. Já que o livro tem poucos diálogos, grande parte dos acontecimentos são totalmente narrados, mais isso não o torna um livro entediante. Flaubert não abusa das descrições (Não chega nem perto de um Eça de Queiroz) e a narrativa flui. Dá para imaginar tudo dentro da cabeça. Há livros que tem poucas descrições dos personagens e do cenário, daí fica difícil imaginar como o autor os imaginou quando os escreveu. Com Madame Bovary é possível imaginar cada expressão de Emma e cada atitude de Charles e todo o ambiente onde a história se desenrola.
No início do livro, logo depois que Emma casa com Charles, que é quando sabemos da sua urgência pela aventura e pelo que é diferente, requintado e belo, ficamos com pena de Emma. Acho que ela é o reflexo de muitas mulheres, inclusive modernas, que são presas ou pela família ou pelo marido ou pela sociedade e não podem vivenciar suas paixões. Acontece que, durante a leitura, à medida que Emma se torna mais difícil de ser agradada, apesar das tentativas constantes do marido e dos amantes, Emma se torna chata. Dá vontade de esganar Madame Bovary! E no final do livro, a gente quer mais é que o Senhor Bovary mande a Madame pastar! Ô, criatura difícil de agradar!
Flaubert não mostra nenhuma reação subjetiva em relação aos seus personagens. É isso que na história da literatura chamamos de realismo. Como já sabemos, algumas das características do realismo são os sentimentos, sobretudo o amor, subordinados aos interesses sociais e o herói problemático, cheio de fraquezas. Se levarmos em conta o título da obra acima, Emma Bovary seria a “heroína”. No entanto, a narrativa começa e termina com o estúpido Charles Bovary e, nela, desempenham um papel importante na trama, o estúpido dom-juanismo de Rodolphe, a estúpida paixão de Léon, a estupidez do padre farisaico Bournisien e todo esse pequeno ambiente de província, que não deixa saída para Emma nem para ninguém. Otto Maria Carpeaux, em seu ensaio sobre a obra, comenta com grande ênfase: “O verdadeiro personagem desse romance é a estupidez humana”.
Comentários
Postar um comentário